sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Jogadores e comentaristas

Paulo Brito, comentarista da Rádio CBN, volta ao assunto.

Sobre aquela citação dos que acreditam que só quem tem prática do futebol são os donos do conhecimento e só eles podem falar, dos ex-jogadores que nem sabem responder as perguntas dos repórteres e que agora deram para louvar o Senhor, na tentativa de justificar as derrotas e vitórias. Eles acreditam que, ao deixarem de jogar, são os únicos com capacidade e sabedoria para falarem sobre o futebol como falar, comentar e escrever – no caso deles só falar – é igual à de chutar uma bola. Volto ao assunto porque quero te passar o que o Horacio Pagani, um cronista argentino pensa a respeito.

“César Menotti disse a alguns anos, num rasgo de soberba que 97% dos jornalistas esportivos não sabem nada de futebol. Procurava desclassificar alguns críticos. É moeda corrente entre os atores (do futebol) depreciar, expressa e veladamente, as opiniões diferentes. Há dezenas de argumentos que se pode usar contra tal disparate – inclusive reconhecendo as particularidades psicológicas e emocionais, intransferíveis, que experimentam os jogadores e treinadores – o que resulta ingênuo pretender que as testemunhas, jornalistas ou torcedores façam análises do fenômeno que é o futebol só sob o ponto de vista do jogador ou do treinador.

Assim poderíamos dizer que 99% dos treinadores e jogadores não entendem nada de jornalismo. Futebol e jornalismo são coisas distintas. Nós dominamos os códigos ou somos capazes de resolver, com nosso corpo, os aspectos técnicos do jogo, para entender o tema e transmitir seus pensamentos, sempre em atenção aos interesses dos receptores.
Mas há quem contrate essas figuras do esporte – com interesses comerciais – para cumprir missão de “símil-periodismo”. Como por exemplo, montar um programa de televisão com um grupo de jogadores e treinadores, encerrados em seus próprios códigos, que os impedem de realizar umas autocríticas sobre companheiros e colegas – realizando um simulacro de uma profissão alheia, sem conhecer seus postulados, seu espírito e sem contar com uma formação mínima para exercê-la.

Porque as habilidades “futeboleras”, por mágicas que sejam em uma cancha, não se projetam em um estúdio ou em uma redação. Cada um com sua missão. Um jornalista não necessita ter sido um esportista profissional para cumprir com seu ofício, nem esportista ou jogador estão impedidos de exercer a função de jornalista. Mas necessitam de uma formação e responsabilidade para cumprir com seus princípios.

Carlos Bilardo, num programa de rádio, em que trabalhou, contestou as criticas que recebeu quando treinador por expressarem opiniões diferentes sobre o fenômeno do futebol. “Agora sou jornalista e tenho o direito de opinar como tal”, desautorizando Enrique Wolf – da ESPN – ex-jogador e em eficaz exercício da profissão por 10 anos.

Mas Pagani ainda acrescenta que não é casual que agora – em tempos de uma modernidade frívola – quando um meio de comunicação elege uma figura (ou ex-figura) de uma atividade não jornalista para que expresse sua opinião relacionada com a sua profissão, normalmente este meio é de característica audiovisual. Porque para quem não tem história na atividade, é mais fácil falar do que escrever. Há exceções que justificam a regra. Eles assinam notas e passam a ser antigas e contemporâneas figuras ou estrelas nos meios gráficos – jornais. Mas em geral, seus textos são corrigidos por jornalistas verdadeiros que, respeitando a idéia do autor, colocam o texto de forma adequada aos interesses do leitor. Esse anônimo, que aporta conceitos, conhecimento e princípios - não é reconhecido publicamente pelas empresas, que usam como desculpa o objetivo de convencer os receptores de que o texto responde letra por letra a opinião do autor contratado de maneira ocasional ou definitiva.

Uma mentira.

Só aqueles que permanecem por muito tempo na intimidade das redações vão descobrindo os segredos do ofício e quem sabe descubram uma vocação, terminando exercendo o ofício como dignidade. Temos exemplos no Brasil...
O jornalista esportivo não nos define como forma explicita e sim uma característica parcial dos jornalistas. Deves ser primeiro jornalista no sentido integral da palavra, depois vem à especialização que não significa que se desmembrou da profissão. Por que sua missão básica é informar, com o compromisso que deve ter com o receptor, protagonistas e fontes, e com responsabilidade ética para facilitar a interpretação geral dos fatos. Seu objetivo é formar uma opinião, com sua própria opinião bem argumentada e desenvolvendo a apaixonante tarefa com humildade e respeito, partindo da premissa que o receptor é alguém que conhece o tema e neste exército brinda a todos com uma visão subjetiva dos fatos, sem “desbordes tecnicistas”.
No futebol todos tem o direito e condições de opinar publicamente, inclusive o torcedor, que define o tema como menos comprometido, pelo menos com os interesses políticos e econômicos da empresa. O esporte, ainda que profissional, é para o torcedor um entretenimento que se pode enquadrar como uma questão menor. Das coisas menos importantes no mundo, o futebol é o mais importante por ser popular, porque desperta uma voracidade de informações diretamente proporcional a esse interesse.

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